A idosa Alvanir e o piano

 

Mesmo já idosa e doente, a Alvanir, dama cearense que lutou pela causa da abolição da escravatura, ainda mostrava vigor tocando seu piano. No ano de 1927, Alvanir, já com 82 anos, morava no interior de Pernambuco, no pequeno sítio Maniçoba, onde futuramente viria a ser Lagoa da Italianinha. fazendo parte do então município de Vila Dourada. Alvanir tinha saído de Fortaleza há mais de dez anos. 

Na mesma casa, viviam ela, sua filha Mônica - a segunda de três filhas - e o pequeno neto Antônio Neto, que tinha 2 anos de idade. A primogênita Lucinha e a caçula Olívia já tinham suas próprias famílias e viviam longe da mãe. 

Sempre à noite, Alvanir, já com uma bengala e as limitações da idade, gostava de se sentar e começar a tocar piano. Mônica disse:

- Vai descansar, mãe...

- Eu já estou descansando, filha. Tocar piano é meu descanso. 

Perto dela, vivia Daniel, seu irmão mais novo, que tinha uma fazenda ali perto. Daniel tinha 67 anos e tinha sua família, vez por outra, visitava Alvanir. 

Numa certa noite, enquanto tocava piano, Alvanir viu seu pequeno netinho Antônio Neto, que se aproximou dela no piano, e ela disse:

- Tá vendo, meu amorzinho? Esse piano foi presente do meu pai, barão Almir. Nós já nascemos em berço de ouro, mas ele me falava muito da minha bisavó Brenda, que viveu lá em Vila Rica, e ela era pobrezinha, mas cresceu na vida. Nunca trate mal as pessoas pobres, um dia, elas podem chegar onde nem imaginamos. Promete, meu netinho?

- Prometo...

Mônica escutou a conversa e ficou incomodada. Na verdade, Alvanir soube que Mônica havia destratado Janaína, uma mulher que vendia comida pelas ruas de Vila Dourada. E não queria que Antônio Neto herdasse tal comportamento. Ainda hoje, com 99 anos, Antônio Neto se lembra desse conselho de sua avó.